Não existe almoço de graça na saúde

A Lei dos Planos de Saúde de 1998 estabeleceu novas regras para o setor. Os novos produtos passaram a ter características que os antigos só poderiam alcançar por meio de migração a um contrato novo ou adaptação do antigo às novas normas, o que trazia aumento de cobertura e, com isso, aumento da mensalidade, reequilibrando o contrato.

Algumas decisões judiciais passaram a entender que os planos antigos não precisavam de adaptação ou migração para receber a cobertura da nova lei. Com isso surgiu um desequilíbrio na relação.

Recente decisão do Supremo Tribunal Federal, em repercussão geral, estabeleceu que as disposições da Lei dos Planos de Saúde “somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como nos contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados”.

Superada essa questão, outro ponto de discussão perante o Judiciário está ligado ao rol da ANS. É que a lei estabelece que cabe à Agência Nacional de Saúde editar o rol de eventos cobertos pelos produtos que a Lei dos Planos de Saúde contempla. Nesse sentido, a ANS sistematicamente edita o rol. Acontece que decisões judiciais estão sustentando que o rol é exemplificativo e não taxativo.

Isso tem impacto no equilíbrio dos produtos, uma vez que a ANS entende como taxativo e elabora os percentuais de aumento a serem autorizados em função do conteúdo do rol. Mas, quando o rol é interpretado como exemplificativo e são tutelados procedimentos não previstos, há um desequilíbrio no contrato, por não ter havido pagamento diluído pela massa de usuários em relação aquele risco que veio a ser coberto.

Entidades ligadas à defesa dos consumidores defendem a postura mais abrangente. Contudo, a atividade suplementar de saúde é uma atividade privada, empresarial, financiada pela contraprestação paga, assim como o SUS é financiado pelos impostos. O aumento de cobertura vai acabar, em algum momento, na mensalidade, como o aumento de gastos públicos termina no aumento de impostos.

Vale aqui aquela máxima de que “não existe almoço de graça”. A conta vai vir.

O aumento das mensalidades acaba por afastar cada vez mais pessoas dos produtos de saúde suplementar, levando todos eles a ter como alternativa apenas o SUS. Como pode ser visto, isto é ruim para todos. Mensalidades mais caras, atividade empresarial reduzida pela evasão de usuários, sistema público sobrecarregado, ao final, aumento dos impostos ou redução do financiamento de todo tipo de obra pelo Estado, inclusive na saúde e saneamento.

A esperança é que a lei seja aplicada e sua interpretação leve à conclusão de que não há como dar cobertura maior do que aquela estabelecida no rol da Agência Nacional de Saúde. Não existe tratamento de graça na saúde.

Gilson Tadeu Lorenzon – Advogado