O papel de cada um!

Jovens do mundo todo marcaram presença na Conferência do Clima das Nações Unidas – COP 26. Diante da incontestável urgência climática, deixaram evidenciada a necessidade da tomada de decisões “para ontem”, apresentando justas cobranças para que seus futuros sejam levados em conta. O único caminho é limitar o gás carbônico na atmosfera e reduzir a emissão de outros gases do efeito estufa. Todas as nações têm obrigações por cumprir, especialmente as metas de emissões a que se comprometeram na última década.

Falando dos “outros”, a China, a Índia e os Estados Unidos são, nesta ordem, os maiores consumidores de carvão. A China consome 5 bilhões de toneladas/ano, mas, mesmo assim, tais nações não se mostram dispostas a consumir menos e buscar fontes de energia limpa. Pelo contrário, são dependentes de uma matriz energética poluidora.

Em que pese 46 países tenham anunciado o abandono do seu uso, o compromisso dos EUA e da China são o de apenas não mais financiarem projetos baseados no carvão em outros países, o que demonstra posicionamento pouco exitoso em relação ao esperado. O diretor executivo da Agência Internacional de Energia (AIE) pontuou que, sem a presença dos EUA e China nesse acordo, as metas para o carvão estão comprometidas.

Infelizmente, a COP-26 deixou evidente a falta de compromisso de alguns países em relação à queima de carvão, o que compromete todo o planeta e promove o aquecimento global. As metas de corte de emissões ficaram muito abaixo do que anunciado desde o Acordo de Paris, e isso foi muito reiterado pelos jovens que estiveram em Glasgow, na Escócia, em todos esses dias de intensos debates.

Falando de “nós”, o Brasil suavizou a retórica de confronto adotada pelo Governo Federal, aliando-se, de alguma forma, aos EUA e à União Europeia, revendo metas voluntárias de corte de emissões e se comprometendo a diminuir as de metano. Isso porque, só no ano de 2020, o Brasil gerou 20,2 milhões de toneladas desse gás, sendo a agropecuária brasileira responsável por 71,9% dessas emissões. Pressionadas por mais de 100 países, as autoridades brasileiras assumiram na COP- 26 (Conferência das Partes) o compromisso de reduzir 30% do gás metano em relação ao patamar de 2020, até 2030.

O nosso ministro do Meio Ambiente lá discursou e cobrou os “ricos” a abrirem seus cofres e garantir financiamento aos emergentes; devem os abonados reconhecer a emergência financeira e mobilizar recursos necessários para atingir os objetivos desejados na Conferência. Proclamou que “o futuro verde já começou no Brasil” e que o país “faz parte da solução”.

Do discurso à prática, além da questão do metano, há um outro ponto positivo para “nós”, e veio do protagonismo levado a efeito pela Fundação SOS Mata Atlântica, presente na Conferência. De fato, 29% da Mata está reduzida, sendo que os caminhos para neutralizar o desmate são zerá-lo até 2030, expandir a agricultura de baixo carbono e reflorestar 15 milhões de hectares de espécies nativas, num projeto incrível que sinaliza para um prazo muito melhor do que inicialmente previsto (2050) para isso acontecer.

Cobra-se muito de “nós”, é verdade! Mas a COP-26 deixa claro que os “outros” também pouco fizeram desde o Acordo de Paris. E cobram porque não estamos dando conta da questão do desmatamento, que representa 44% das emissões de gases de efeito estufa do país, sendo 90% oriundo de atividades ilegais, de acordo com o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável. Os gases de efeito estufa cresceram 9,5% em 2020, mesmo com a pandemia.

Assumamos o nosso papel, pelos jovens da Conferência e também por nossos jovens. Muito embora o Brasil tenha se comprometido com a redução da emissão de metano e o Ministro tenha dado o recado que aqui em terras tupiniquins o “futuro verde” já começou, fazer parte da “solução” é muito mais do que discursar: é imprescindível que se desenvolvam políticas públicas, fiscalização e estímulo financeiro para frear desmatamentos ilegais e reduzir emissões de gases do efeito estufa.

Forças disruptivas

Há poucos anos, para liquidar uma obrigação financeira ou você dava um cheque ou realizava um DOC como ordem de crédito. Em 2002 o Banco Central criou o Sistema de Pagamentos Brasileiros, permitindo o chamado TED – transferência eletrônica disponível.

Num passado recente, para obter dinheiro a opção era um empréstimo nos tradicionais bancos ou valer-se de um generoso agiota. Depois vieram as factorings, as cooperativas de crédito e, mais recentemente, as fintechs, que oferecem assessoria personalizada, cobram taxas menores e usam tecnologia com maior segurança e interatividade.

A evolução dessas coisas todas é ainda cada vez mais rápida. Hoje em dia, tudo pode ser resolvido pela internet, de pagamentos a transferências, passando por empréstimos bancários e também investimentos. Um celular e uma conexão à internet substituem toda uma infraestrutura que encarece serviços e burocratiza processos. No Brasil são 230 milhões de smartphones ativados!

Duas novidades decorrem das chamadas “forças disruptivas” (inovações que tornam os produtos e serviços mais acessíveis e baratos, tornando-os disponíveis a uma população muito maior) que nos são apresentadas e presenteadas logo quando acordamos, dia após dia.

A primeira delas é o sistema de pagamentos instantâneos, o denominado PIX, a começar a funcionar na semana que vem. Será possível enviar dinheiro para outra pessoa ou estabelecimento, via celular, tão fácil quanto mandar um whatsapp. No PIX só é necessário o CPF, CNPJ ou celular, à escolha do usuário, sem necessidade de número de conta e agência bancária. Não demorará mais do que 10 segundos a operação e funcionária 24 horas por dia, 7 dias por semana. O custo é mínimo: R$ 0,01 a cada dez transações e isso quando for empresa.

O QR Code também é opção para essa nova modalidade, tanto para pessoas físicas quanto jurídicas. Eis que, como será aceito por todos, o PIX põe na lona (e manda para o museu) as operações TED, DOC, cheque, cartão de crédito, débito, boleto, maquinha disso, daquilo e por aí vai!

Nesta primeira fase, quase 1000 empresas já querem fazer uso do PIX.

A outra novidade é que as operadoras de telefonia passam a oferecer produtos financeiros para os milhões de clientes pré ou pós pagos: Vivo, Tim e Claro ofertarão crédito pessoal, de R$ 1.000,00 a R$ 30.000,00, com taxas de juros próximas aos dos empréstimos consignados.

Fácil notar que o “novo” vai acirrar a concorrência e propiciar melhores oportunidades e descontos para o consumidor. Com o PIX, de um lado, e sua facilidade de remessa e recebimento de valores, operações financeiras, e as operadoras, de outro, propiciando produtos financeiros em condições convidativas e captação de novos clientes, só restará aos bancos tradicionais baixar tarifas e apresentar algo diferente e vantajoso, sob pena de amargurar perdas jamais pensadas.

Aliás, anotem aí também que o Banco Central deve liberar o WhatsAppPay, serviço que permitirá a realização de pagamentos por meio da rede social de mensagens, como também já autorizou o Sandbox Regulatório, um ambiente em que entidades são autorizadas a testar, por período determinado, projetos inovadores na área financeira ou de pagamento.

É muita coisa ao mesmo tempo nesse nosso mundo disruptivo!

Destaques verdes!

Nesta semana na qual se rendem encômios aos “verdes torcedores” do futebol brasileiro, bem a propósito uma outra reflexão auspiciosa, agora sobre as intituladas “profissões verdes”.

Num ambiente de preocupação para os profissionais que estão ainda com empregos ativados e, principalmente, para a nova geração saindo do forno dos cursos de formação técnica e teórica, matéria digital no “Estadão” de 31 de janeiro destaca o que certamente ocorrerá nos próximos 10 anos em relação ao crescente interesse do mercado por profissionais que atuam com processos e tecnologias que reduzem os impactos ambientais e contribuem para a pauta da sustentabilidade.

Segundo pesquisa da Universidade de São Paulo, 11 profissões com enfoque ambiental terão grande chance de emplacar no mercado de trabalho. Estudantes de Física, Engenharia, Geografia, Economia, Administração, Direito, Química, Engenharia Ambiental, Arquitetura e Urbanismo, Psicologia Ambiental e Biologia estariam muito bem inseridos num contexto otimista de vagas desde já e para os próximos 10 anos.

De imediato já se nota carência de profissionais para engenharia, geografia e física, no que diz respeito a projetos de energia limpa e mitigação de riscos ambientais. Análise de riscos climáticos e a elaboração de projetos para empresas que precisam reduzir o seu passivo ambiental também são atividades muito características nessa onda das profissões verdes.

Estima-se a geração de 15 milhões de empregos até 2030 na América Latina -destacando-se o Brasil – segundo estimativa da OIT, agência que pertence à Organização das Nações Unidas.

Mercado financeiro, tecnologia e projetos de descarbonização também vêm movimentando profissionais especializados na economia verde.

A energia solar para uso residencial é um dos segmentos com ampla possibilidade de absorção de novos profissionais, ao mesmo tempo em que as próprias mudanças climáticas tornaram os geógrafos disputados no mercado. Segundo a pró reitoria da USP, a procura por profissionais de geografia é intensa, não havendo número suficiente nem para atender ao setor público, pior ainda para a incrível demanda da iniciativa privada.

Para novatos e experientes, enxergar as grandes áreas de atuação, ampliando a visão para a dinâmica dos fenômenos climáticos e surgimento e aprimoramento de tecnologias é a grande sacada.

Consultorias profissionais das áreas citadas – que contemplem a um só tempo uma pauta sustentável sobre temas ambientais, sociais e de governança – vão ao encontro do indesviável enfrentamento de impactos climáticos, oportunizando a prestação de serviços para empresas de moda, energia, indústria e agronegócio em geral, por exemplo.

No mercado financeiro a demanda é por dinheiro descarbonizado. No ramo do Direito a atuação na área de estratégica das empresas no sentido de promover as avaliações de operações em que instituições financeiras se envolvem como parceiro ou na concessão do crédito. O Compliance Ambiental para as empresas que buscam crédito também é bom filão para a Advocacia.

Psicologia ambiental, com poucos formandos até aqui e muita perspectiva de demanda, envolve a dedicação ao comportamento humano e sua inter-relação com o ambiente, com a finalidade de mitigar impactos de grandes obras ou trabalhar com construtoras na definição de projetos de grandes e variados impactos à coletividade.

Alguns irão dizer que essa onda verde não é novidade no mundo corporativo. É verdade, mas 2020 foi o estopim para o “espírito de urgência”. Parece que estamos atrasados e precisamos correr com essas questões envolvendo sustentabilidade, saneamento, produção de biocombustíveis, veículos elétricos, energias renováveis.

O que irá fazer a diferença serão as especializações estratégicas dentro das áreas, voltadas tanto para a adoção de uma economia verde por parte das empresas, quanto para a conscientização dos demais profissionais envolvidos ao longo da cadeia de transformação.

Não há como imaginar um futuro na economia sem modificações nas relações entre o homem e o meio ambiente. Portanto, sair do velho modelo de formação profissional é o primeiro lampejo para quem acha que as carreiras, na forma tradicional, não decolam mais como antes.

Anywhere office

Coisas como o teletrabalho, home office e, agora, anywhere office, vêm impactando as relações laborais, comerciais e, consequentemente, os negócios jurídicos.

As contratações de viagens (lazer e trabalho), hospedagens, serviços em geral, locações e aquisição de imóveis e veículos, dentre outros, sofreram impactos negativos e positivos com a pandemia. Tem havido muito trabalho para os advogados ajustarem os acordos ou promoverem ações judiciais.

O home office é tendência que, para milhões, será o normal de agora em diante. O que as empresas irão fazer com seus escritórios modernos ocupando vários andares em pontos nobres é uma incógnita. Não haverá o retorno de colaboradores aos antigos espaços físicos. Ficarão em definitivo em suas casas, gerando uma economia impressionante para os seus empregadores e consequente benefício ao meio ambiente.

A virtualização do trabalho mexeu de modo direto com o mercado imobiliário. Projetos de novas incorporações imobiliárias estão sofrendo alterações constantes. Parcerias envolvendo proprietários de terrenos e construtoras estão sendo afetadas pela necessidade de se acompanhar o que o mercado está agora querendo, diferentemente do que o consumidor queria há nem um ano atrás.

Se até o ano passado, por exemplo, interessava muito ao potencial adquirente um apartamento de 2 ou 3 dormitórios pequenos, o home office influenciou de tal maneira os negócios imobiliários que muitas incorporadoras alteraram os seus projetos iniciais: foram modificados para melhor atender às novas expectativas do mercado.

Ter duas ou mais garagens no projeto já não era muito o grande chamariz nos lançamentos de novos apartamentos, em razão até da explosão e grande aceitação dos transportes por aplicativo e mobilidade coletiva, a Covid (e as doenças que virão cada vez com mais intensidade de tempos em tempos) provocou nos arquitetos um repensar modificativo, na medida em que volta a interessar o transporte individual até que vacinas para novos vírus surjam e (venham) rápido. Aliás, o poder público já está a exigir que os novos projetos tragam tomadas para os modernos veículos híbridos ou totalmente elétricos. Nessa inclinação de modernidade e preocupação sanitária, o tamanho das unidades passa a merecer mais metros quadrados, até porque, se o trabalho será mais em casa, maior conforto e privacidade serão necessários, minimizando a sensação de confinamento.

Para os que não fecharam as portas após tanto tempo de crise, os resorts pegaram carona (juntamente com as companhias aéreas) no anywhere office e estão oferendo serviços para que as crianças possam se divertir e estudar ao mesmo tempo (já que também só têm aulas on line). Alguns estabelecimentos contrataram pedagogos para auxiliar os alunos. Os provedores de acesso à nuvem acompanham o anywhere office e também figuram nesse mercado aquecido.

Assim, famílias que podem flexibilizar o trabalho e conseguem passar dias num hotel ou em localidades distantes de ondem moram e desempenham presencialmente suas atividades, têm também impulsionado novas relações negociais.

A pandemia e sua decorrente virtualização do trabalho dá uma chacoalhada no mercado imobiliário e suas inerentes relações comerciais, ao mesmo tempo em que ressuscita o turismo em novos contornos impensados noutros tempos.

50+: novas funções

Kai-Fu Lee, um dos maiores especialistas mundiais em inovação tecnológica e seus efeitos na sociedade, é tido como o criador da inteligência artificial como a conhecemos hoje em dia. Na obra “Inteligência Artificial”- Como os robôs estão mudando o mundo, a forma como amamos, nos relacionamos, trabalhamos e vivemos”, o autor faz reflexões importantes acerca do fim de muitas das profissões como as conhecemos hoje, ao mesmo tempo em que, a exemplo do que ocorreu em outras grandes revoluções históricas da humanidade, Kai-Fu Lee tranquiliza o leitor ao afirmar que a inteligência artificial apenas mudará a forma como trabalhamos. À medida que postos convencionais forem extintos, outros serão criados para atender às demandas da sociedade informatizada e muito rápida em tudo o que é transformação digital.

Muitos sofrerão os danos psicológicos advindos da perda do emprego por causa do crescimento da inteligência artificial. Da temporariedade do desemprego (suportável por algum tempo) à percepção de se estar permanentemente excluído do funcionamento da economia, a distância é grande e leva a consequências muitas vezes trágicas.

Algumas soluções surgem no meio desse cenário preocupante, dentre elas a reciclagem de trabalhadores, a redução de horas de trabalho ou a redistribuição de renda.

Os que tem 50 anos ou mais e precisam ou querem continuar trabalhando sentem mais o impacto da inteligência artificial. Chegando aos 50 anos a impressão de quem está na ativa é a de que o fim da capacidade de produzir pode estar próximo. A concorrência fica difícil com o jovem. Pode não haver mercado para os mais maduros.

Mas a boa notícia é que, se de um lado a inteligência artificial avança sobre os empregos tradicionais, a longevidade do ser humano está a demandar novas funções corporativas.

Quem alegra os corações dos com mais de 50 anos é Marina Dayrell, repórter de Carreiras e Empreendedorismo, em matéria publicada no Estadão de setembro passado.

Marina alerta que, em 2050, 30% da população terá mais de 60 anos. Cita levantamento da Fundação Dom Cabral Longevidade e Hype50+, que aponta oito carreiras que irão gerenciar a longevidade e a diversidade etária nas empresas nos próximos anos. O mercado precisará de profissionais que lidem com a longevidade, a exemplo do que já vem ocorrendo em países que envelheceram primeiro, como Austrália e Inglaterra. No Japão há empresas que contratam pessoa de 80 anos.

Que tal então se preparar para assumir a função de Conselheiro de Aposentadoria ou “coach de carreira especializado nos 50+”, um profissional habilidoso que cuidará do planejamento da aposentadoria?

Também poderá atuar como Age Adviser, uma espécie de conciliador de desacordos entre gerações? As diferenças de pensar entre gerações da mesma família criam conflitos que prejudicam a sociabilidade e as atividades produtivas. As tecnologias (inclua-se aí a inteligência artificial) são absorvidas e refratadas diferentemente todo o tempo pelos mais novos e pelos mais idosos.

Ou quem sabe atuar como um Chief Health Officer, responsável por analisar programas de saúde para uma empresa ou um coletivo associativo? Também poderá você leitor ser um Chief Innovation Officer, ou seja, um líder de equipe que pesquisa inovações a partir da longevidade.

Também poderá atuar como um Consultor em gestão da longevidade, ou seja, um criador de soluções para o desenvolvimento das pessoas durante suas carreiras, especialmente para os 50+.

Por que não um “Historiador Corporativo”? Sim, um profissional com experiência capaz de resgatar a memória da empresa, incutir princípios corporativos nos mais novos, moldá-los no perfil da corporação, destacando a evolução empresarial e o reconhecimento positivo e sólido do mercado. Profissionais maduros, experientes, misturados com os mais novos, servem à formação e desenvolvimento de novas gerações.

Enfim, se de um lado a Inteligência Artificial assombra fortemente, de outro a criatividade e necessidades nascidas desse fenômeno tecnológico transformador inspira e cria demanda por novas funções corporativas, especialmente as associadas à cada vez mais gradativa longevidade.

“Virtus in medium est”

A polarização política se apresenta como reflexo natural de ocorrências comuns, não importa em que nação e em que canto do planeta: o desencanto profundo com os poderes constituídos (Judiciário especialmente), partidos políticos, corrupção e imprensa manipulada.

Nos EUA, eleitores republicanos e democratas têm atualmente divergentes visões sobre o papel do estado na economia, políticas de contenção do coronavírus, mudanças climáticas e outras, certo que 80% do eleitorado não teve contato com pessoas com visão política diferente.

As pessoas não precisam concordar em tudo. Porém ficou difícil assistir – sem se indignar – a manifestações racistas cada vez mais hostis, incitações ao rancor, antagonismos e divisões sociais. Lá, Trump estimulou divisões, nunca somou e isso preocupou não só os norte-americanos, mas também as nações liberais democráticas.

Aqui no Brasil a polarização radical, especialmente nas redes sociais, é algo nunca visto: lesivo, imponderável e assustador, crescente que será até o próximo pleito eleitoral.

Importante destacar que a vida pública do eleito Joe Biden sempre foi movida no caminho de trabalhar pela unificação em tempos determinantes, como agora, no furacão de uma pandemia mundial e polarizações descontroladas. Aliás, Biden, em 2017, decidiu concorrer à Casa Branca quando viu neonazistas, supremacistas brancas e integrantes do Ku Klux Klan nas ruas, num crescente da organização política dos ódios.

Nessa polarização, o centro achou seu norte nas figuras de Biden e Kamala! “Virtus in medium est”, ou melhor, a virtude está no meio: nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Nem oito, nem oitenta!

Biden representa uma derrota do retrocesso civilizatório, a partir da votação popular mais significativa registrada por um candidato em mais de 200 anos nos EUA, animando os mercados pela previsibilidade, cooperação internacional e retomada de consensos como, por exemplo, a preservação do meio ambiente.

Com quase 50 anos de vida pública (seis mandatos como senador e oito anos como vice de Obama), marcada por tragédias pessoais e incríveis superações, personalidade moderada, embora não se apresente de forma eletrizante, Biden se tornou o político mais votado da história norte americana: 240 mil americanos vitimados pela Covid, grave crise econômica, explosões de racismo e violência policial, associados à polarização política levaram ao mais alto comparecimento às urnas em mais de um século, mesmo período de tempo em que apenas 5 presidentes americanos não se reelegeram, incluindo o próprio Trump.

vice, Senadora Kamala Harris, capítulo à parte, representa as expectativas e anseios de quem confia nas conquistas civilizatórias, liberdades públicas e no papel fundamental da mulher e dos negros nas engrenagens da cidadania e no restauro da integridade e da normalidade de uma nação que, ao menos no passado, espargia democracia, no papel e na prática.

No contexto da polarização e crise econômica sanitária sem precedentes, é hora de união e de cura das nações que precisam ser menos divididas.

A ignorância espalhada em países como Estados Unidos, Brasil, Hungria e Índia (para citar alguns) não traz benefício algum às nações.

É por isso que a perspectiva de um fim à era de raiva e divisão ganha contornos importantes com Kamala e Biden. Os desafios e aflições do povo americano convergem em parte com os dos brasileiros: saúde, economia, racismo, meio ambiente, armamento, política externa e polarização estão na pauta diária.

Nesse cenário positivo em que se restauram, com Biden/Kamala, valores democráticos, liberais e de festejo aos direitos humanos, individuais e das minorias, os interesses bilaterais do Brasil e EUA sairão mais fortes, até porque são mais profundos e duradouros do que a relação entre indivíduos sazonais com a caneta e poder nas mãos.

Como sempre dito pelo inigualável Obama, “nós podemos”! Sim, nós podemos acreditar, a partir de agora, em dias melhores. Basta que as instituições e a sociedade, encontrando o seu “centro” – a virtude está no meio -, imponham freios às idiossincrasias ideológicas que nada trazem de positivo. Se as democracias sobrevivem aos piores ataques e inimigos, bastando existir liberdade, cidadania ativa, império da lei e liberdade de imprensa, a busca de meios-termos é o melhor caminho para revitalizar o sistema político.

Homens e livros

Afirma Eliane Cantanhêde (Estadão de 16.08) que a realidade e os fatos vão para um lado e a popularidade do Presidente da República vai para outro. O desempenho questionável no combate à pandemia e o desmanche no Ministério da Saúde (governadores e prefeitos que se virem com a coisa!), a disparada nas queimadas, o abandono e exclusão da cultura da pauta nacional e a política externa vergonhosa estão fortes na boca da oposição ao governo, mas é um antagonismo que, pelas recentes pesquisas, acaba soando mais para gritaria de arquibancada (que ataca forte o juiz), mas não muda o placar do jogo!

Parte da derrota da realidade é fácil de se explicar: 35% de todo o auxílio emergencial de R$ 600,00 serviu ao Nordeste (com 27% da população do país). Em 2019 metade da população do Nordeste viveu com cerca de R$ 260,00 mensais e os 10% mais pobres recebiam menos do que R$ 60,00. O impacto dos 600 reais é imenso. Lula sabia demonstrar sua “preocupação” com o povo da região e sempre ganhou por lá. Bolsonaro descobriu a fórmula, ao mesmo tempo em que parou com a metralhadora incontrolada contra tudo e todos, o que fez crescer sua aprovação nas pesquisas mais recentes.

Nesse ambiente de “aclamação” popular, aproveita o führer para tentar acabar com a isenção de tributos sobre os livros. Paulo Guedes, o ministro (ainda ativado), quer pôr fim ao incentivo e onerar o setor, pois entende que livros são artigos para a elite e que o governo os dará de graça aos pobres.

Só faltava essa!

Para Monteiro Lobato, um país se faz com homens e livros. Tudo o que possa prejudicar o acesso do cidadão ao livro deve ser rechaçado.

Em nota de repúdio, a OAB Nacional já se posicionou com indignação à proposta de reforma tributária que poderá onerar em 12% os livros no país e inviabilizar o trabalho de muitas editoras, autores, artistas gráficos, ilustradores, livrarias e toda a cadeia produtiva.

Aumentar o preço dos livros é trancar as portas da oportunidade, do estudo, da educação, da formação de todo um povo. É conspirar contra o desenvolvimento e aumento da competitividade do Brasil. Em última análise, é atravancar reconhecido caminho pelo qual o povo pode alcançar vida digna por meio do estudo e da educação de qualidade.

Sem contar que a literatura nas periferias é veículo de formação de identidade, daí porque o acesso à leitura jamais deve ser privilégio, mas uma prerrogativa de todos, do pobre ao rico. O cidadão de baixa renda tem o direito de escolher o que quer ler e não pode ficar sujeito às doações de livros pelo poder público, conforme orientação político-ideológica do governo de plantão, como sugestiona Guedes.

É fato: a medida pretendida prejudicará a ampliação do acesso à educação e à cultura. Quanto mais leitores e leitoras, mais desenvolvimento humano, mais economia forte. Prejudicar o acesso ao livro atrapalha a formação das pessoas, especialmente quanto à cultura política.

No Brasil, há mais de 70 anos, desde a Constituição de 1946, o livro é isento de impostos, por conta de iniciativa de Jorge Amado.

A estratégia fiscal de Guedes naufragou, as contas estouraram, as privatizações não saíram. A reforma tributária é necessária, até aí tudo bem, mas taxar o livro (como um pretenso mecanismo de maior arrecadação para o governo), num contexto econômico em que diversas livrarias estão em recuperação judicial e o poder público não nutre os quatro cantos do país com livros para quem precisa, não passa de bibliografia de mau gosto.

Sobre deixar “a conta”

Consoante dados declarados pelo Município de Rio Claro ao Tesouro Nacional, as contas públicas de nossa Cidade Azul figuram dentre os 5 maiores rombos do país, com R$ 232,8 milhões em 2019 (Estadão do dia 10 de outubro).

Esse dado alarmante preocupa o Rio-clarense, que quer ver sua cidade funcionando bem, ao menos nos setores prioritários, o que demanda recursos suficientes para engraxar as engrenagens da máquina pública. Como será 2021 para o novo prefeito?

Duas questões jurídicas chamam a atenção: a segunda parece neutralizar, de alguma forma, a primeira!

A primeira é como ficarão as contas de Rio Claro neste último ano de mandato, uma vez que, segundo previsto no artigo 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF -, é proibido ao titular do Executivo, nos últimos dois quadrimestres do mandato, contrair obrigações de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte. Isso evita que o novo eleito assuma a gestão já arcando com dívidas acumuladas pelo antecessor.

Numa primeira análise, se Rio Claro já está com seus cofres bem ruins em 2019 segundo o ranking publicado no “Estadão”, imagine-se agora, em 2020, diante da crise sem precedentes e inevitável queda de receita. Ao menos em tese, tudo direcionaria para possível violação da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Contudo, houve uma alteração na LRF, justamente por conta da pandemia, modificação essa trazida pela Lei Complementar 173, que criou o socorro federal a estados e municípios, afastando essa obrigatoriedade de se garantir disponibilidade de caixa para quem irá assumir em 2021, desde que os recursos sejam destinados ao combate à calamidade pública reconhecida.

O fato é que prefeitos em fim de mandato (muitos em campanha para reeleição, gastando os tubos para mostrar serviço) estão lutando para que haja flexibilização para toda e qualquer espécie de despesas, e não só as destinadas ao combate da pandemia.

Os Tribunais de Contas (e o Ministério Público de Contas depois) terão muito trabalho pela frente, estimam os especialistas, diante das brechas que a Lei traz em seu conteúdo e o próprio contexto da situação dos cofres públicos.

Portanto, a regra geral é: ordenar despesa em fim de mandato sem que haja dinheiro em caixa (deixar como herança dívidas ao seu sucessor) é prática vedada pela LRF, ato considerado, inclusive, crime pela Lei Federal 10.2028/2000 (Lei de Crimes de Responsabilidade Fiscal) com pena de reclusão de 1 a 4 anos.

De outro lado, a regra especial em tempos de pandemia é a seguinte: fica afastada a obrigatoriedade de disponibilidade de caixa pelo que sai para quem assume em 2021, aí veremos se as despesas incluídas nesse verdadeiro “salvo conduto” ficarão adstritas às relacionadas à calamidade ou se os intérpretes dos Tribunais de Contas aceitarão também outras espécies de gastos, num grande pacotão que livrará de um processo crime que não foi primoroso no administrar as contas municipais.

A conta vai sobrar mesmo para os novos prefeitos: socorro!

Tempo: precioso

No mundo moderno o tempo é moeda cara, porque escasso e irreversível. Perdido no trânsito, na fila, na burocracia, no “fale conosco”, no “reclame aqui”, no “0800”, no “atendimento ao cliente”. Tempo que não volta mais. Extravio de tempo útil que afeta um maior convívio com a família, com os amigos, interfere no investimento nos estudos, no cuidado da mente, do corpo, da alma! Há uma constância de atrasos (a que não demos causa) que nos desviam de nossas atividades produtivas, causando prejuízos de vários espectros.

Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada, são coisas de nosso cotidiano moderno, fazendo parte de uma normalidade não intensa e não duradoura que possa chegar ao ponto de romper o equilíbrio psicológico do ser humano.

Mas, quando o desperdício de tempo útil imposto ao consumidor é decorrente da forma consciente (ou inconsciente) com que um fornecedor de produto ou serviço age, com intensidade e danos que fogem do suportável, do tolerável, ultrapassando padrões de normalidade resultando em efetiva angústia e aflição, o ponto passa a merecer outro ângulo.

A indiferença ou despreocupação propositais, fazendo com que o consumidor desista do seu justo intento, ou o desdém culposo no atendimento, a partir da redução do quadro de frente ou de suporte técnico para diminuir custos empresariais, levam à responsabilidade objetiva do fornecedor, diante da regra risco-proveito, presente no Código de Defesa do Consumidor.

É disso que surge a moderna teoria do desvio produtivo do consumidor, acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive. Ao privar o consumidor de seu precioso tempo, submetendo-o a percalços intermináveis para a solução de problemas oriundos de má prestação de serviços, por exemplo, o STJ condenou um fornecedor ao pagamento de danos morais, pois impediu o consumidor lesado de dedicar-se ao exercício de atividades que melhor lhe interessavam.

Essa teoria aplica-se nas hipóteses em que o consumidor, diante de uma situação de mau atendimento, precisa desperdiçar o seu tempo e desviar-se de suas competências – de uma atividade necessária ou por ele preferida- para resolver um problema criado pelo fornecedor.

O descaso do fornecedor para com o consumidor reclamante, quando o cenário extrapola o tolerável, ultrapassa o mero dissabor, supera o leve aborrecimento, suplanta pequenas mágoas e irritações, enfim, fugindo da normalidade, enseja, ao menos em tese, a reparação por danos morais.

Sabe aquela fila no banco de mais de hora e meia; aquela operadora de TV a cabo ou concessionária de gás encanado que te faz ficar horas e horas esperando pelo técnico (porque ou ele irá de manhã, ou à tarde, em até 3 dias….) que, por vezes, não vem e remarcará para sabe-se lá quando? Sabe a ligação de energia que te faz ficar afastado da atividade produtiva, à mercê do fornecedor que não pré-anuncia hora exata que fará a visita? E aquele equipamento eletrônico que não sai da assistência e o problema persiste por meses a fio? E a tentativa frustrada de cancelar uma assinatura de revista contratada por impulso?

A teoria do desvio produtivo vem das lições do doutrinador Marcos Dessaune, que sinaliza para a responsabilidade do fornecedor pelo desperdício injusto e intolerável do tempo útil do consumidor e da consequente vida alterada pelo menosprezo impingido.

Portanto, diante de um mau atendimento ao consumidor, contínuo e ofensivo, ocasionando a perda de tempo proveitoso, tal situação é passível de indenizações, abrindo o caminho para reparações que, até pouco tempo, não recebiam aval das Cortes Brasileiras.

William Nagib Filho, Advogado e Conselheiro da OAB/SP

Multipropriedade

O mercado imobiliário é sensível aos ventos que sopram diferentemente a cada instante. Muita gente está precisando vender propriedades para pagar contas, investir em novos projetos, retomar outros afetados pela pandemia e por aí vai.

Imóveis com viés de lazer, tais como chácaras, casas na praia e ranchos de pesca, por exemplo, têm utilização limitada e valor de mercado significativo, portanto mais difíceis de vender. Às vezes até dá vontade de comprar um ranchinho, uma casa de praia, mas quando você se dá conta, sabe que não vai conseguir visitar por mais do que poucas semanas no ano inteiro. Bom, mas há várias pessoas que também gostariam de ser donas do rancho de pesca, da chácara cinematográfica e, igualmente, não conseguiriam usufruir por muitos dias.

Mais do que nunca, o momento é de invocar a Lei 13.777, de dezembro de 2018, que instituiu a chamada multipropriedade, regime de condomínio em que cada um dos proprietários de um mesmo imóvel é titular de uma fração de tempo, à qual corresponde a faculdade de uso e gozo, com exclusividade, da totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma alternada. Bem comum noutros países, aqui no Brasil sempre existiu algo parecido, mas a Lei de 2018 deu os contornos adequados para legalizar projetos de multpropriedade.

O imóvel objeto da multipropriedade (comerciais também podem) é indivisível, não se sujeitando a ação de divisão ou de extinção de condomínio, incluindo as instalações, os equipamentos e o mobiliário destinados a seu uso. Normalmente serão 13 proprietários que dividirão o ano em 4 semanas para cada um. Cada fração de tempo é indivisível, certo que o período será de, no mínimo, 7 (sete) dias, seguidos ou intercalados, e poderá ser fixo e determinado, no mesmo período de cada ano, flutuante, caso em que a determinação do período será realizada de forma periódica, mediante procedimento objetivo que respeite, em relação a todos os multiproprietários, o princípio da isonomia, devendo ser previamente divulgado; ou misto, combinando os sistemas fixo e flutuante. Se você só pode pescar em outubro, será nesse mês os seus 4 períodos de 7 dias.

Todos os multiproprietários terão direito a uma mesma quantidade mínima de dias seguidos durante o ano, podendo haver a aquisição de frações maiores que a mínima, com o correspondente direito ao uso por períodos também maiores.

Institui-se a multipropriedade por ato entre vivos ou testamento, registrado no competente cartório de registro de imóveis (o papel do cartório é fundamental nesse processo todo), devendo constar daquele ato a duração dos períodos correspondentes a cada fração de tempo.

Os multiproprietários estipularão a convenção do condomínio no tocante às instalações, equipamentos e mobiliário do imóvel, de manutenção ordinária e extraordinária, de conservação e limpeza e de pagamento da contribuição condominial, o número máximo de pessoas que podem ocupar simultaneamente o imóvel no período correspondente a cada fração de tempo, a criação de fundo de reserva para reposição e manutenção dos equipamentos, instalações e mobiliário, dentre outras situações

O multiproprietário poderá usar o imóvel, instalações, equipamentos e mobiliário, podendo ceder a fração de tempo em locação ou comodato a terceiros. Poderá vender a fração de tempo ou onerá-la, podendo ainda participar e votar em assembleias.

Terá obrigações, como pagar a contribuição condominial do condomínio em multipropriedade e deverá responder por danos causados ao imóvel, às instalações, aos equipamentos e ao mobiliário por si, por qualquer de seus acompanhantes, convidados ou prepostos ou por pessoas por ele autorizadas;

Você que tem um imóvel nessas condições e sabe que vender para um comprador só será muito difícil, que tal procurar a imobiliária de sua confiança e dar um start num projeto de multipropriedade?

Um bom trabalho de marketing é fundamental para alavancar o negócio. É um importante novo segmento de mercado, estimula a compra, impulsiona os serviços de manutenção e locação, reduz despesas, há intercâmbio com outros destinos, impulsiona a aspiração pela aquisição de imóvel de maior padrão e o mais importante, o uso por tempo limitado atende à agenda dos que têm o mesmo sonho e desejo pelo efetivo uso de determinado tipo de imóvel.